terça-feira, 5 de janeiro de 2010

O que disse a Economist sobre o Brasil

Seguindo a dica do Eduardo Graeff (twitter aqui), resolvi dar uma olhada no informe especial da revista The Economist sobre o Brasil, publicado em novembro de 2009. Seguem abaixo os links para as reportagens dessa edição, com tradução livre de alguns trechos (que, espero,  ajudem a desmascarar a mentira dos ignóbeis):
O Brasil decola - agora o perigo para a grande estória de sucesso latino-americana é a hubris
De fato, o crescimento do Brasil tem sido gradual, e não de uma hora para outra. Os primeiros passos foram dados nos anos 90 quando, tendo esgotado todas as outras opções, firmou-se em um conjunto sensato de políticas econômicas. A inflação foi domada, e os governos federal e locais foram obrigados por lei a controlar seus débitos. Foi concedida autonomia ao Banco Central, encarregado de manter a inflação baixa e de assegurar-se que bancos driblassem o espírito aventureiro que prejudicou Inglaterra e EUA. A economia foi aberta ao comércio e investimento estrangeiros, e muitas estatais foram privatizadas.
Enfim, agregando - O Brasil costumava ser de prometer. Agora ele começa a cumprir
Muito do presente sucesso do país deveu-se em boa parte aos seus governos recentes, em particular os de FHC de 1995 a 2003, que criaram um ambiente macroeconômico estável e previsível em que negócios pudessem florescer (apesar de ainda hoje o governo continua a  se meter no caminho de empresas tentando gerar lucro e criar empregos). Como se deu essa espetacular transformação? E como empresas brasileiras e estrangeiras, desde fábricas de baton a bancos de investimento, aproveitaram a nova estabilidade do país? Para entender por que o Brasil parece tão atrativo para brasileiros e estrangeiros, é bom entender quão afundado ele estava no início dos anos 90. Desapontamentos passados também explicam três coisas sobre o Brasil que estrangeiros às vezes tem dificuldade em entender: sua desconfiança nos livres mercados; sua fé na sabedoria da intervenção estatal nos negócios e nas finanças; e taxas de câmbio persistentemente altas.
(...)
O atual presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, tem sucedido em levar quase todo o crédito do recente crescimento do país que talvez pertença propriamente ao seu antecessor. Ainda assim a realização de Lula tem sido manter as reformas que lhe foram herdadas e adicionar algumas de sua autoria - o que não é uma tarefa fácil dado que nos últimos sete anos seu próprio partido tem tentado arrastá-lo para a esquerda.
Quebrando a rotina - Uma breve história das crises econômicas brasileiras
  • 1973-79: os choques do petróleo
  • 1982: a dívida
  • 1986: o Plano Cruzado
  • 1990: o Plano Collor
  • 1994: a crise da tequila
  • 1997: a crise asiática
  • 1998-99: a crise russa e dos fundos de cobertura
  • 2001-02: o estouro da bolha das ponto-com e a dívida da Argentina
  • 2007-?: a crise financeira global
A sobrevivência do mais rápido - crises frequentes favoreceram bancos fortes e financeiras ágeis
O Brasil tem um sistema híbrido de bancos de varejo, com bancos privados e estatais competindo diretamente. É altamente concentrado: o Itaú Unibanco, o maior banco privado, está entre os 15 maiores do mundo em várias medidas e ainda assim quase não tem presença fora do país. O Banco do Brasil, o maior banco controlado pelo Estado e umas das instituições financeiras mais velhas do mundo, compete com o Itaú pelo título de maior banco do país. O crédito de bancos estatais equivale a 37.6% do total e tem crescido recentemente.
(...)
Apesar de o Itaú sozinho ter mais de 25 mil caixas, mais de 500 municípios no Brasil não tem sequer uma agência. Os dois tipos de banco competem mais ferozmente nos comparativamente ricos sul e sudeste do Brasil. O Banco do Brasil recentemente contribuiu para a concentração geográfica ao comprar a Nossa Caixa, um banco estatal de São Paulo, e uma grande parte do Banco Votorantim, um banco privado.
(...)
O governo aumentou o limite de participação estrangeira no Banco do Brasil para 20% para atrair mais capital, mas os bancos estatais não são tão bem geridos quanto os privados, e assim a esperada competição não se materializou. O mais claro sinal disso são os spreads - a diferença entre o custo para o banco de contrair e oferecer empréstimos. O Instituto de Desenvolvimento Industrial calcula que as taxas médias empréstimo são 35% mais altas que as taxas médias de depósito, em contraste com menos de 10% em outros países do BRIC.
(...)
Para compensar a ausência de um mercado em empréstimos de longo prazo, o Brasil criou um banco de desenvolvimento gigante, o BNDES, com um balanço patrimonial maior que a do Banco Mundial. Esse banco é financiado por um imposto sobre o trabalho e empresta predominantemente às maiores empresas brasileiras - o oposto do que se esperaria de um país esquerdista.
Embarques e desembarques - estrangeiros investem no Brasil enquanto empresas brasileiras compram lá fora
Os investimentos no Brasil que falharam tendem a ter uma coisa em comum. As empresas chegam no Brasil cheias de otimismo, pagam muito a um escritório de advocacia e então vão embora quando a situação se torna difícil, geralmente vendendo de volta a companhia para uma firma brasileira por uma fração do preço que haviam pago.
(...)
Agora que o Brasil se tornou mais previsível menos investidores caem nessa armadilha, mas há outras. Devido ao sistema legal ruim, é melhor evitar disputas comerciais com outras empresas. Isso torna laços pessoais especialmente importantes. E uma vez que os filhos do chefe estejam tranquilamente casados com os filhos de seus parceiros comerciais, qualquer companhia que queira ser bem-sucedida no Brasil deve aprender a arte do jeitinho - o jeito brasileiro de contornar obstáculos que daria calafrios em um departamento de conformidade (compliance) europeu ou americano.
(...)
Alguns casos de sucesso se beneficiaram da privatização, ou ao menos de privatização parcial. Um dos mistérios sobre o Brasil é por que políticos se sentem incapazes de falar sobre privatização apesar de tantos sucessos.
(...)
O atual governo brasileiro parece hostil à idéia de que a privatização melhora as empresas, mas por outro lado gosta da idéia de ter empresas brasileiras bem-sucedidas no exterior. O BNDES bancou o apoio retórico do governo emprestando 8 bilhões de dólares só este ano para ajudar na expansão de multinacionais brasileiras.
Condenado à prosperidade - o Brasil aprendeu a amar seu setor de commodities
O Brasil tem terras cultiváveis em abundância, mesmo sem destruir suas florestas para criar mais, e muito de seu cultivo é feito por negócios pequenos e familiares que poderiam aumentar a produção com mais capital e melhor administração. O Brasil já teve êxito nisso antes. Em grande parte graças à Embrapa, uma agência de pesquisa estatal, fazendeiros nos anos 60 e 70 aumentaram paulatinamente a área em que plantações podiam ser cultivadas.
(...)
Mas antes da agricultura brasileira atingir todo seu potencial, há alguns problemas a serem solucionados. O primeiro é um antigo argumento sobre quem tem direito a quais pedaços de terra. A posse de terra fica mais incerta o quanto mais se aproxima da linha do Equador. No Amazonas isso resulta em desmatamento em que os fazendeiros estabelecem a posse de facto das terras. Em outras partes do Brasil as disputas se dão através de invasões de terra pelo MST, que tem muitos simpatizantes ideológicos no governo, incluindo o próprio presidente.
(...)
Como era de se esperar em um movimento mal organizado em um país grande, o MST apresenta várias faces, dependendo do lugar. Um de seus assentamentos mais antigos, em Pirituba no Estado de São Paulo, agora se parece a um kibbutz misturado com ambientalismo hippie. Em contraste, em Pernambuco membros do MST atiraram e mataram quatro homens no início deste ano.
O Estado que se auto-flagela - empresas são encurraladas entre um governo obstrutor em competidores ilegais
O problema do Estado brasileiro não é que ele seja arrogante e incompetente, uma queixa comum, masque ele é fraco onde deveria ser forte e forte onde deveria ser fraco. Ele é capaz de negar licenças ambientais para barragens hidroelétricas ou portos, impedindo que sejam construídos, mas não é capaz de impedir o esgoto de ser diretamente jogado no rio que passa pela sua maior cidade, ou impedir madeireiros de destruir suas florestas. O governo pode dificultar em muito as empresas de contratar e demitir funcionários ou de pagar seus impostos, mas não pode impedir que a cada ano 45 mil de seus cidadãos sejam mortos.
(...)
Os impostos chegam a 36% do PIB, comparado aos 28% dos EUA. Ainda assim às vezes a melhor analogia a suas instituições é a de o laboratório de um alquimista maluco onde ouro é transformado em chumbo. O Brasil gasta o triplo do que a China em sistema de saúde por pessoa, mas seus indicadores básicos de saúde são um pouco piores. O gasto em educação é respeitável, 5% do PIB, mas os alunos brasileiros normalmente estão entre os últimos colocados em comparações internacionais do OECD.

Há dois outros artigos (aqui e aqui) que eu não citei acima, e obviamente há muito mais informação nas reportagens originais (sugiro particularmente o último link da lista acima). Mas espero que esse post dê uma idéia do conteúdo dessa edição da Economist, digam o que digam os impostores.

Obs: Quem tiver estômago pode ver as imposturas aqui, aqui, aqui ,aqui e aqui.


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