segunda-feira, 14 de julho de 2008

Caça ao gordo e aos cientistas

Trechos de artigo de João Pereira Coutinho na Folha:
Pobres gordos. Numa cultura que elevou a saúde, a juventude e a beleza a patamares verdadeiramente insanos, a espécie já não tinha vida fácil. Mas uma coisa é a estética; outra, bem mais grave, são os imperativos da ética. Agora, a ciência resolveu dar uma ajuda para empurrar os gordos rumo ao abismo moral.

...

Por enquanto, a ciência fala. Como falou no passado contra outras classes de viciosos (os fumantes, por exemplo), que foram progressivamente desumanizadas pelas sociedades higiênicas do Ocidente.

Depois da ciência falar, e de estar criado o clima ideal para a intolerância e para o preconceito, os políticos terão uma palavra sobre o assunto, criminalizando certos comportamentos tidos por "desviantes" ou "anti-sociais". Já está a suceder na Europa, onde se discute seriamente se os hospitais públicos devem tratar pessoas que fumam, comem em excesso ou não praticam exercício físico com masoquismo diário. O raciocínio é exemplar: por que motivo os meus impostos devem ser usados para tratar um fumante, um gordo ou um sedentário?

Curiosamente, não parece passar pela cabeça dos zelotes que os fumantes, os gordos e os sedentários também pagam impostos e, como é lógico, esperam ser tratados pelas instituições que sustentam. Essa evidência não passa pela cabeça dos zelotes porque os fumantes, os gordos e os sedentários já perderam há muito o estatuto de cidadania plena, habitando as catacumbas clandestinas da sociedade civilizada.

Cabe-me lembrar que essa ciência, que fala e aponta, não é a Ciência que eu conheço. Feita por "pesquisadores", e não cientistas, ela está mais para a "estatística de jaleco", que já sabe o que vai ver antes mesmo de começar a pesquisa. As Ciências Naturais não possuem conseqüências éticas, dado que a descrição factual da natureza não implica em valores de certo/errado. Seu conhecimento ajuda a tomar decisões mais responsáveis, mas o fato em si não implica em decisões "naturais", que competem à sociedade. É perigoso e irresponsável o pesquisador determinar as políticas públicas decorrentes de sua pesquisa - na condição de pesquisador, ou seja, de intérprete da natureza. Quem vigiará os vigilantes?

Mas - felizmente, creio eu - o mais comum é a apropriação inadequada de pesquisas legítimas. No caso, há cientistas genuinamente interessados em detectar as causas e correlações da obesidade. Porém, para cada passo (publicação, digamos) dado pelos cientistas, setores da sociedade (políticos, profissionais do emagrecimento, etc.) extrapolam e distorcem a pesquisa à revelia. E cientistas (principalmente os que preferem o diploma ao livro) também respondem a estímulos, ou seja, se há verbas abundantes e a impressão de que a manutenção dessas verbas depende do resultado da pesquisa, candidatos a culpar o sucesso de vendas da cerveja pela barriguinha (ou vice-versa, vai saber) é que não vão faltar.

Essa interpretação também se aplica às pesquisas tabagistas, aquecimento global, e qualquer manipulação política de progressos científicos. O que me entristece é que essa manipulação exige uma resposta, também política, travestida de ciência. Ela é nova? Não, o exemplo clássico para mim é o darwinismo social, que na verdade é mais velho que o Darwin (vem de Malthus), e recebeu a teoria evolutiva como a cereja no bolo de racismo que estava a fermentar. Não é necessário dizer que o coitado do Darwin não pode ser responsabilizado pelos excessos cometidos pelos darwinistas sociais.



3 comentários:

  1. Leonardo, vi um comentário de abril falando sobre o Instituto Mises Brasil.

    Nos EUA não há nenhuma semelhança entre o Libertarian Party e o Mises Institute. O que acontece é o contrário, quase ninguém do Mises Institute apoia a iniciativa do Libertarian party.

    E complementando, o Instituto Mises Brasil é separado do Mises Institute.

    Qualquer dúvida, entre em contato.
    Abraços

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  2. Apesar de não me lembrar onde fiz esse comentário, a informação é utilíssima. E uma boa notícia, dado que o Partido Libertário é, antes de mais nada, um partido...

    Obrigado, Juliano!

    ResponderExcluir

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